24 Abril 2009 - Vicky Cristina Barcelona


Título original: Vicky Cristina Barcelona
De: Woody Allen
Com: Penélope Cruz, Javier Bardem, Scarlett Johansson, Rebecca Hall
Género: Comédia, Romance
Classificacao: M/12
Origem: Espanha/EUA
Ano: 2008
Cores, 96 min
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Luís Miguel Oliveira in PÚBLICO, 23 de Janeiro
"Vicky Cristina Barcelona" é um filme sobre a passagem do tempo, os amores e as oportunidades perdidas, um jardim chekhoviano plantado à beira do Mediterrâneo.
Mandaria uma ideia feita (e muito, digamos, "publicitária") sobre Woody Allen dizer que ele foi para Barcelona para se "revigorar". Parece-nos questão de somenos, essa. A ordem de necessidade é doutro género: foi para Barcelona porque precisava de ir para algum lado que não fosse Nova Iorque, que não fosse na América. Mais do que o londrino "Match Point", pequeno ensaio dostoievskiano-bressoniano sobre o crime, o castigo e o acaso, "Vicky Cristina Barcelona" é um filme sobre algo que na literatura também se transformou em género ou subgénero: os americanos no estrangeiro. Escolheu Barcelona e os seus (m)ares mediterrânicos, e o filme confere sentido a essa escolha, mas podia ser outra cidade qualquer.
Temos assim duas jovens americanas arrancadas à sua cápsula nova-iorquina para umas férias de Verão na capital da Catalunha. Vicky (Rebecca Hall, maravilhosa) e Christina (Scarlett Johansson, mais indolente do que nunca), muito amigas mas diferentes em temperamento como a água e o vinho. Christina é candidata a artista, saltita de namorado em namorado, tem costumes que a moralidade comum daria por "dissolutos"; Vicky é mais conservadora, mais "uptight", tem casamento marcado com um rapaz novaiorquino tão "uptight" como ela, a moralidade comum não encontraria muita coisa que lhe reprovar. Depois o desenvolvimento da história confirma isto, assim como os dilemas das raparigas nascerão em grande parte das respectivas configurações psicológicas, mas ainda antes de acontecer alguma coisa já a voz "off " nos explicou como eram Vicky e Christina, sobrepondo-se aos planos que as mostram, de táxi, no trajecto entre o aeroporto e a cidade (em sequência que abrira com a câmara focada nos grandes mosaicos que decoram o aeroporto de Barcelona, primeiro e subliminar sinal de que as raparigas chegaram a terra perigosa e sanguínea, bem diferente da sóbria e neurótica Manhattan). E a voz "off" de "Vicky Cristina Barcelona" tem que se lhe diga: em dicção rápida e radiofónica, instila gravidade (o narrador fala no mesmo tom em que narraria uma invasão de marcianos, por exemplo) e uma medida de urgência, como se Woody a usasse também para cortar caminho, para ir directo ao essencial, para não perder tempo com o que é da praxe. A gravidade e a urgência trazem à história um sentido de angústia que começa por parecer desproporcionado, mas que no fim se transformou na exacta proporção da angústia em que a história quer (e consegue) trabalhar.
Na "mise en scène" de Woody Allen isto traduz-se por uma secura invulgar, transições rápidas entre cenas (contem os planos de ligação, as coisas que são "da praxe": quase não existem), uma velocidade interior que nunca é certa (a primeira cena de sedução entre Javier Bardem e Scarlett no quarto dele, tão longo preliminar para tão abrupto desenlace), mesmo os campos-contracampos têm uma tensão especial. Claro que a grande estranheza com que as raparigas se confrontam é menos a cidade (reduzida a apontamentos, a Sagrada Família, o Parc Guell, etc, mais uma visita às Astúrias porque para Vicky ceder não basta a estranheza, é precisa a "estranheza dentro da estranheza") e mais os seus habitantes. Bardem, primeiro, Penélope Cruz, depois.
Na fronteira com o estereótipo, Bardem e Cruz são quase "monstros" - ele a hipérbole do "macho latino", hedonista e sexualmente insaciável, ela um expoente da feminilidade "mediterrânica", amante tão possessiva como maternal, uma força da natureza como uma Loren ou uma Magnani. O que, através deles, Woody Allen faz projectar diante de Vicky e Christina é uma espécie de filme da latinidade, sanguínea e intempestiva, totalmente incompreensível para as raparigas, que só serve (sempre como "projecção") para lhes criar a perspectiva de qualquer coisa que se passa demasiado depressa e demasiado profundamente para que elas a consigam agarrar. A gravidade agudiza-se (passe o paradoxo), "Vicky Cristina Barcelona" transforma-se num filme sobre a passagem do tempo, sobre os amores e as oportunidades perdidas, um jardim chekhoviano plantado à beira do Mediterrâneo. A angústia estampada nos rostos de Vicky e Christina quando o filme as deixa explica por que razão Woody começara por insistir nos seus costumes: nenhuma delas está certa, no universo alleniano a "moralidade" nunca foi uma resposta à altura do fatalismo que a engole.


17 Abril 2009 - A turma


Título original: Entre les Murs
De: Laurent Cantet
Género: Drama
Classificacao: M/12
Origem: França
Ano:
2008
Cores, 128 min
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Luís Miguel Oliveira in PÚBLICO, 9 de Dezembro
"A Turma" capta a luta de classes que subjaz ao relacionamento entre professores e alunos
Todo o cinéfilo desconfia da famigerada "relevância sociológica" (ou "política", ou nalguns casos "cultural"). Quando, a propósito de um filme, se destaca mais a intensidade com que ele reflecte certos assuntos que estão na ordem do dia e a quantidade de "discursos" que sobre eles o filme (tornado "transparente") permite engatilhar. "A Turma" corre esse risco de se dar a ver como mostruário, "self service" temático de menu "urgente": a educação, a organização da escola, o multiculturalismo, a integração e a inserção, enfim, uma agenda facilmente confundível com as colunas de opinião na maioria dos jornais e revistas. Mas corre o risco de maneira, diríamos, consciente, assimilando-o como parte do seu funcionamento (a rodagem, como veremos, associou a "experiência cinematográfica" à "experiência social"), e sendo capaz de encontrar um filme no meio da agenda, de impor um ponto de vista que já não é exactamente do mesmo tipo.
Laurent Cantet fez-se conhecer por dois belos filmes, "Recursos Humanos" e "O Emprego do Tempo", sobre a "luta de classes" e a organização laboral contemporâneas, embrulhadas numa angústia melodramática. Para "A Turma" partiu do livro de um professor de um liceu parisiense, François Bégaudeau, que relatava a sua experiência como professor de Francês. Foi essa experiência que decidiu reproduzir em "A Turma". O filme é uma ficção mas tem pressupostos cravados no real, até, como dissemos, no seu modo de feitura. Cantet pegou em Bégaudeau (que interpreta o seu próprio papel) e encerraram-se num liceu de Paris, "entre les murs" (título original do filme), com os alunos.
Durante a rodagem, todos, adultos e adolescentes, viveram personagens criadas na fronteira entre o que estava determinado e o que cada um trouxe da sua experiência pessoal. Sem dúvida que isso explica muito do poder de "A Turma": um fortíssimo efeito de real, uma convicção profunda, uma absoluta credibilidade de personagens e situações. Aquela sala de aula tem, sobre o espectador, o efeito de um campo magnético, que o atrai, o prende, e o implica muito para além de questões de reconhecimento ou de identificação. Culturalmente, a turma do professor é a alegre misturada que imaginamos em muitos liceus por essa Europa fora: filhos de imigrantes, do Magrebe, de África, da China, das Antilhas (e, conspicuamente denunciado por uma t-shirt encarnada, um representante da lusodescendência). Este "cocktail", acirrado pelos vários sentimentos de pertença em confronto, é um dos temas do filme, exponenciado por naquela aula se tratar da língua francesa e da cultura francesa, e portanto do ensino de um elemento (supostamente) padronizador de toda aquela diversidade.
Mas a escola, "a turma", é também o espaço da adolescência. A "idade do armário", o desafio da autoridade, a necessidade de afirmação frequentemente um pouco estúpida. A habilidade maior do filme de Cantet está em não traçar uma distinção clara entre o que se justifica "sociologicamente" e o que não tem outra explicação que não passe pela psicologia adolescente. No debate que se seguiu à apresentação do filme no DocLisboa, na semana passada, alguém na assistência mencionou o clima de "guerra" constante que marca a relação, numa escola contemporânea, entre professores e adolescentes. "A Turma" filma muito bem essa guerra, capta muito bem o "teen power" (que é uma coisa recente de que os adolescentes se viram investidos por uma cultura, televisiva, publicitária, totalmente virada para eles, e pelo fácil acesso a todo o tipo de informação, mesmo que "inútil") e a espécie de variação sobre a luta de classes que subjaz ao relacionamento entre professores e alunos. Apesar do que diz Cantet (que falou da preocupação por ter uma câmara "equitativa"), é o ponto de vista dos adultos que sobressai, e de maneira bastante ferida - ainda no princípio, um professor com um ataque de frustração fornece a primeira cena em que sentimos "A Turma" a funcionar para além do seu estrito pressuposto. Mas essa frustração, mais resignada, mas também mais disseminada, criando uma peculiar atmosfera de desilusão e abandono, volta no fim, numa conclusão que tem uma validade "poética" tanto como uma qualidade comentadora pessimista: "A Turma" é um filme sobre uma derrota.

10 Abril 2009 - O estranho caso de Benjamin Button


Título original: The Curious Case of Benjamin Button
De: David Fincher
Com: Brad Pitt, Cate Blanchett, Tilda Swinton
Género: Drama, Romance
Classificação: M/12
Origem: EUA
Ano: 2008
Cores, 166 min
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7 Abril 2009 - Valquíria


Título original: Valkyrie
De: Bryan Singer
Com: Tom Cruise, Kenneth Branagh, Bill Nighy
Género: Drama, Thriller
Classificacao: M/12
Origem: Alemanha/EUA
Ano: 2008
Cores, 123 min
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